A reducao do investimento chines na Nova Rota da Seda: entre a reducao de gastos e a preparacao para urna crise financeira internacional/The Trend of Reduced Chinese Investments in the Belt and Road Initiative: Spending Contentions and Preparations for an Upcoming Financial Crisis/La reducci - Vol. 32 Núm. 1, Enero 2020 - Revista Desafíos - Libros y Revistas - VLEX 842511643

A reducao do investimento chines na Nova Rota da Seda: entre a reducao de gastos e a preparacao para urna crise financeira internacional/The Trend of Reduced Chinese Investments in the Belt and Road Initiative: Spending Contentions and Preparations for an Upcoming Financial Crisis/La reducci

AutorSpellmann, Samuel
Páginas1H(32)

Introdução

O modelo de crescimento econômico chinês tem sido exaustivamente discutido através das últimas duas décadas. (1) A manutenção das altas taxas de crescimento do Produto Interno Bruto (pib) posteriormente à crise financeira de 2007-2008 ocorre lado a lado com o acréscimo progressivo dos índices de renda per capita e da Paridade do Poder de Compra (PPC) chinês. A consolidação do modelo particular de desenvolvimento económico, não são exclusivamente decorrentes de melhorias na produção em escala e de técnicas intensivas de produção, que caracterizaram as últimas três décadas de atividade produtiva chinesa, mas sim devido a diversificação das atividades relacionadas a reprodução do capital.

A República Popular da China (RPC) está em pleno processo de transição de uma economia fortemente baseada na indústria pesada para a construção e consolidação de um setor de serviços domésticos, enquanto diversifica sua produção, direcionando sua atenção para a indústria de alta tecnologia e para o controle de mercados de energias renováveis. A China dá indícios de mudança na sua posição ocupada anteriormente nas Cadeias Globais de Valor (CGVS) como nação intermediária, na qual fábricas são instaladas e através das quais circulam insumos básicos, mas onde faltava produção intelectual e um mercado doméstico capaz de consumir sua própria produção (Sun & Grimes, 2018). Tanto no seguimento de supercondutores, atravessando o setor de painéis solares ou no desenvolvimento de tecnologia de ponta, a RPC adentra a segunda metade da década dos anos 2010 visando expandir sua influência para o resto do globo, anunciando, em 2013, a construção da Nova Rota da Seda (NRS). (2)

A realização da NRS, projeto geopolítico em construção anunciado numa sequência de encontros multilaterais na Ásia (promovidos pelas lideranças de Estado e Governo), sendo possível graças a uma série de parcerias bilaterais difusas e ao mesmo tempo coordenadas. A iniciativa, como é informalmente referida em inglês (Belt and Road Initiative, BRI), distribui-se através de três continentes e constitui verdadeira amalgama de empreendimentos dirigidos para a promoção dos objetivos de desenvolvimento da China. A NRS visa diversificar as rotas comerciais asiáticas e simultaneamente reduzir o tempo dispendido no transporte de mercadorias. A NRS promove a interconexão de mercados produtivos e consumidores através da construção de supervias de transporte e através de uma cadeia de portos interconectados.

No percurso da NRS diversas novas fontes de geração de energia estão sob construção. Através da NRS, a China visa promover o estreitamento comercial entre os países envolvidos. Entre outros objetivos, a China busca melhorar relações de vizinhança na Ásia através do fortalecimento de sua rede de laços políticos, econômicos e culturais, enquanto promove e expande parcerias no setor de segurança centradas no entorno geográfico chinês (Chung & Voon, 2017).

O projeto também responde às necessidades da China por insumos básicos cuja origem pode ser traçada para diversas partes do mundo, não só contribuindo com os objetivos chineses ligados à segurança alimentar, mas também provendo ferro e petróleo para a China através de meios alternativos àqueles tradicionalmente usados, como o Estreito de Malaca. Ainda tomando forma, a NRS é, para Callahan (2016), um projeto ambicioso, constituindo-se como parte da grande estratégia chinesa para reconstruir a ordem regional Eurasiática, fundando-se sobre um novo arcabouço jurídico, estabelecendo novas instruções normativas e novos ideais de governança (Callahan, 2016; Ferdinand, 2016).

A NRS é composta de duas partes: um seguimento terrestre, o Cinturão Económico da Rota da Seda e a transoceânica Rota Marítima da Seda do século XXI. É importante mencionar que a Rota Marítima da Seda do século XXI mantém um relacionamento especial com países membros da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), embora se estenda através da Ásia-Pacífico, cruzando o oceano Indico, o golfo Pérsico, a costa da Península Arábica, alcançando o mar Vermelho e o Mediterrâneo. Ao afirmar fortalecer os laços culturais e comerciais entre a China e os países atravessados por seus projetos, a RPC projeta suas operações diplomáticas para uma 'Nova Era' em seu relacionamento bilateral e multilateral em todo o globo e especialmente na Asia.

Através do Corredor Econômico da Rota da Seda, a China busca construir uma rede de autoestradas e ferrovias, oleodutos e gasodutos, assim como instalações elétricas e de fibra ótica, conectando o leste da China à suas províncias orientais, a Ásia Central, Moscou e eventualmente ao porto de Rotterdam (Arase, 2015; Callahan, 2016).

Da perspectiva do financiamento da NRS, o Banco Asiático de Investimentos em Infraestrutura (BAII) pode ser identificado como o principal ator financeiro da NRS. Anunciado em 2014, e oficialmente inaugurado em 2016, o banco público de fundação chinesa contava, em 2018, com a participação de sessenta e oito nações (68) na condição de membros efetivos, e, outras dezenove (19) aguardando ratificação legislativa doméstica. A quantidade de países interessados em investir no BAII cresce continuamente. (3) Com um capital inicial autorizado de cerca de US$100 bilhões, o banco dedica-se ao desenvolvimento de projetos de infraestrutura pertencentes à NRS, realizando esta atividade através de diversas formas de alocação de capital, desde investimentos de capital à investimentos financeiros (Weiss, 2017). No sentido de complementar a atuação do BAII, em novembro de 2014, Xi Jinping anunciou a criação do Fundo da Rota da Seda, fundo público cujo objetivo seria apoiar empreendimentos e outras instituições privadas investindo em projetos ligados à NRS (Ferdinand, 2016; Chung & Voon, 2017; Magalhães, 2018).

É necessário, contudo, mencionar que a NRS tem tido outras fontes de financiamento. Por exemplo, dado o empréstimo de US$62 bilhões para apenas uma de suas artérias, o Corredor Econômico China Paquistão (CECP). Entende-se que a gestão financeira de subprojetos alinhados sob o signo da NRS advém de diversas fontes de financiamento. Projetos do CECP são financiados por bancos públicos chineses--como o Banco de Importações e Exportações da China (Eximbank) e o Banco do Desenvolvimento da China (BDC)--, bem como por diversas empresas chinesas e paquistanesas, e por instituições financeiras internacionais--como o Banco Mundial (BM) e o Banco Asiático de Desenvolvimento (BAD)--.

Após o anúncio da NRS, notícias começaram a sublinhar as motivações e vantagens domésticas da grande alocação de capital envolvida. O encorajamento da integração econômica global é uma narrativa que ilustra e ressalta uma mudança na posição ocupada pela China nas CGVs. A construção de uma vasta rede de infraestrutura e a consolidação de boas relações comerciais com países vizinhos, favorece o fornecimento estável de insumos básicos, fator necessário para o suprimento das demandas do mercado doméstico chinês, em um momento em que o mesmo experimenta uma mudança estrutural em sua matriz económica. Estes fatores colocariam a RPC como uma nação promotora da globalização via discurso pró-multilateralismo, beneficiando-se do posicionamento favorável a liberalização dos mercados e ao livre comércio. Entretanto, a importância significativa destas mudanças também assinala a condição única de change-maker da China no atual estado do Sistema-Mundo.

Entretanto, esta visão do futuro contrasta com os resultados disponibilizados através de relatórios de investimentos de diversas empresas de consultoria, publicados em 2018. A China parecia estar reduzindo seus investimentos na NRS. Estas narrativas difundiram-se através de diversos veículos de comunicação, que continuamente assinalavam a queda dos investimentos chineses a partir de meados finais de 2016, quando Beijing decidiu implementar restrições aos fluxos de capital que deixavam o país (Ghiselli, 2017; Wildau & Ma, 2017; Zhang, 2017). O Fluxo de Investimento Externo Direto Não-financeiro (IED-NF) partindo da China destinados para nações designadas como pertencentes a NRS teria decrescido por volta de 2 % em 2016 em relação a 2015, e, em maio de 2017 haviam caído 18% em termos absolutos no ano, de acordo com dados do Ministério do Comércio da República Popular da China (MOFCOM) (Ghiselli, 2017; MOFCOM, 2017).

Além disso, tem reverberado o fato de que o fluxo de IED-NF para os sessenta e três (63) países demarcados pelo MOFCOM (2017) como pertencentes à NRS totalizaram novos US$14,5 bilhões em 2016, um montante que cobria apenas 9 % do total global do fluxo de IED-NF proveniente da China no mesmo ano. Diante dos dados, observou-se, entretanto, o declínio referencial do IED-NF na NRS em comparação com o aumento proporcional do mesmo tipo de investimento no resto do globo, situação que poderia amenizar a realidade por trás dos números. O IED-NF chinês global para o ano de 2016 experimentou um aumento de 40 % em relação a 2015, o que elevou o investimento chinês à níveis recordes.

É nesta dinâmica que este artigo se insere. Inicialmente, buscou-se analisar os dados relativos à evolução do fluxo IED-NF partidos da China para países assinalados como pertencentes a NRS. Para tanto, observou-se dados entre os anos de 2013 e 2016, que constituem os primeiros quatro anos desde o anúncio oficial do desenvolvimento da NRS. Os dados analisados foram coletados a partir de diversas edições do Statistical Bulletin of China's Outward Foreign Direct Investment. Os relatórios do MOFCOM Express também foram analisados neste artigo, uma vez que não há coincidência expressa entre os dados mencionados nos relatórios do MOFCOM Express e no Statistical Bulletin, fato que receberá uma explicação ao longo do texto. Objetivou-se com esta análise, verificar se de fato houve uma redução nos investimentos chineses na NRS nos anos assinalados. Se isto ocorre, então abre-se a possibilidade para se questionar o padrão...

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