Urbanização nas cidades brasileiras: qualidade de vida e aspectos da violência, o caso de Marília - Núm. 9, Julio 2010 - Ratio Juris - Libros y Revistas - VLEX 217955689

Urbanização nas cidades brasileiras: qualidade de vida e aspectos da violência, o caso de Marília

AutorEdemir de Carvalho
CargoDoutorado em Programa de Pós Graduação Em Sociologia
Páginas80-95

Este trabalho é resultado da primeira parte de duas pesquisas realizadas em Marília, cujos títulos são: "Cidadania, pobreza e qualidade de vida em Marília" e "Geografia do Crime de Marília: diagnósticos para uma ação social.

Doutorado em Programa de Pós Graduação Em Sociologia. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, Sao Paulo, Brasil. Título: A sociabilidade fragmentada na metrópole contemporânea, Ano de obtenção: 1998. Orientador: Dulce Consuelo Andreata Withaker. Bolsista do(a): Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior. Mestrado em Programa de Pós Graduação Em Ciências Sociais. Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP, Campinas, Brasil. Título: Crise urbana e habitação popular em Campinas. 1870-1956., Ano de obtenção: 1991. Orientador: Sandra de Negraes Brisola. Bolsista do(a): Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

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Visando melhor compreender e discutir as soluções propostas aos problemas relacionados com a qualidade de vida das populações de baixa renda, especialmente os segmentos favelados e aquelas residentes em conjuntos habitacionais populares em Marília. Além disso, resgatar e propiciar a oportunidade de ampliar os horizontes conceituais e de exercício da cidadania.

Tem-se em vista realizar um Projeto Piloto multidisciplinar, que congregue diferentes profissionais compromissados com subprojetos específicos, a serem desenvolvidos junto aos moradores favelados e em conjuntos habitacionais populares.

A preocupação metodológica central e constituir uma multidisciplinaridade, cujo desenvolvimento seja intentado num trabalho teórico, que tenha vínculo com a realidade possibilitando a criando e difundindo novas discussões e conhecimentos, sobre esta realidade.

O Brasil é considerado, incontestavelmente como um país permeado por contrastes, os quais, dificilmente poderiam ser atenuados, dado grau de desigualdade que eles provocam especialmente em relação às condições de convivência entre os diferentes grupos sócio-econômicos. Essas condições de convivência entre esses diferentes grupos tornaram-se particularmente adversas a partir dessas duas últimas décadas (80 e 90), especialmente nas cidades brasileiras.

E na década de 90 que observamos um Brasil com mais de 80% de sua população residindo em cidades. Essa imensa concentração da população em áreas urbanas explicitou e conseqüentemente, as desigualdades de renda, riqueza e poder acentuaram-se por diversas razões os contrastes da sociedade brasileira.

A experiência brasileira no que tange a concentração na distribuição de renda, confirma o quadro da pobreza no Brasil: como diz Oliveira, "a concentração na distribuição de renda no Brasil mostrava em 1960, que 50% mais pobre da população ficavam com 17,7% da riqueza nacional. Em 1981, eles ficariam com 13,4%, e em 1989 com apenas 10,4%.En-quanto isso, os 10% mais ricos, ficariam com 39,6% em 1960 e saltaram em 1981 para 46,6% e em 1989 para 53,2%. E entre esses 10% encontravam-se os l% mais ricos ainda da população brasileira que ficaram em 1960 com 11;9%, em 1981 com 13,4% e em 1989 com 17,3% da renda nacional" 1.

O Estado brasileiro ao invés de incrementar as políticas sociais voltadas à redução dessas desigualdades, tem reduzido as verbas sociais e, conseqüentemente, colocando em risco os projetos de forte impacto social.

Dados como estes denotam a tom agudo das crescentes desigualdades da sociedade brasileira, provocando o rompimento das possibilidades da existência de laços de uma cidadania mais ampla. São os contrastes extremos de riqueza e poder, que impõem condições adversas de vida à grandes contingentes populacionais, gerando insustentáveis tensões sociais.

As cidades brasileiras constituemse a expressão da manifestação mais concreta das desigualdades sociais, as quais exibem-se de forma extremamente clara, a verdadeira extensão das fronteiras marcadas Page 81 por esses obstáculos à cidadania. De um lado, são os luxuosos condomínios construídos dentre enormes muralhas com seguranças particulares; aqui as fronteiras são espetacularmente visíveis. Por outro lado, o processo de favelização cresce cotidianamente, desvelando de forma incontrolável, as tímidas iniciativas governamentais para atenuar o seu crescimento. Para além desses extremos, outra fronteira sem muralhas, fala por si só dessa profunda desigualdade: as condições concretas de pobreza e miséria desses segmentos da população.

Esses fenômenos caracterizam-se pela sua amplitude, atingindo, indistintamente, cidades localizadas nos confins da floresta amazônica, como também as grandes metrópoles do Centro-Sul industrializado. Portanto, eles são observáveis em qualquer recanto do país, ou seja, as precárias condições do exercício da cidadania, enquanto síntese dessas desigualdades manifestam-se indistintamente, em todas cidades brasileiras.

No cenário urbano do estado de São Paulo, a cidade de Marília não se apresenta de forma diferente. A emergência de problemas, tipicamente urbanos, principalmente aqueles relacionados com a expansão da sua periferia e, como também, os da especulação urbana, que têm conseqüência a criação de uma imensa "barreira" de acesso à terra e da intensificação da sua privatização.

Coincidentemente, a emergência dos problemas urbanos, particularmente o da "favelização" tem o seu início nos primeiros anos da década de 80 (vide tabela 1), quando a economia passa a ter uma transformação significativa.

Tabela l. Situação das favelas e pessoas faveladas em Marília

1997 1998
número de favelas 18 1 9
pessoas faveladas 4.632 4.967
famílias faveladas l.l38 1.236
crianças de 0-6 anos 928 973
crianças de 7-12 anos 81 849
adolescentes de 13-18 anos 705 734
idosos 158 208
handcap 38 43

Fonte: Secretaria Municipal de Promoção Social - Prefeitura Municipal de Marília 1998

A questão da favelização, adquire inquestionável relevância, visto que, constatações desse quilate sempre são acompanhadas de "soluções e ações" duvidosas, ou ainda, de explicações apressadas e de fácil aceitação pela opinião pública, fazendo com que o Estado assuma uma falácia, traduzida em práticas governamentais de pouco "fôlego" e sem conseqüências sérias em relação ao problema.

A existência de favelas em Marília , nos sugere a presença de uma crise urbana, dado o grau de articulação e complexidade dos problemas urbanos nela existente e, para muito mais além disso, o centro desta questão está na própria constituição da cidadania.

O visível empobrecimento da cidade de Marília, evidenciado pelo surgimento de favelas e da sua periferia urbana, também, inicia um processo vai marcar toda a década dos anos 80 e ampliada nos anos 90.

A presença de favelas revela a segregação da população no processo de produção do espaço, onde milhares de pessoas passam a viver em espaços de risco, sem a mínima infraestrutura, ou seja, a fa- vela, na realidade, passa a ser o nó central da crise urbana, pois ela representa a expressão física do aprofundamento da desigualdade, claramente explicitada pela cidade.

Esse aprofundamento demonstranos que a cidade de Marília pode ser elegida dentro de um contexto de excepcionais condições, num ambiente de dados representativos, como é o incontestável número de 21 (vinte e uma) favelas e, aproximadamente, 5.500 (cinco mil e quinhentas) pessoas nelas habitando. Isso ocorrendo em uma cidade nova e em expansão, que, além de estar fora do eixo mais dinâmico da principal economia do estado de São Paulo 2, ela Page 82 se constitui num exemplo significativo de questões cruciais relacionados com a pobreza urbana e, consequentemente, com o da cidadania.

Na cidade Marília, as favelas encontram-se localizadas em áreas públicas, sendo que o seu processo de ocupação ocorreu geralmente de forma gradual, promovida individualmente por cada interessado e avalizada pelo poder local. Ao contrário dos grandes centros, nunca houve um movimento de favelados que promovesse ocupações em larga escala; aqui é o próprio estado que, sem estabelecer uma política definida, foi instalando ou permitindo a ocupação dessas áreas públicas.

Os moradores das favelas pertencem a um segmento da classe trabalhadora não qualificada, e, invariavelmente, vivem de serviços esporádicos sem na realidade possuírem uma renda mensal fixa.

A cidade de Marília como várias outras cidades, teve seu panorama urbano e rural paulatinamente modificado, ou seja, a população que na década de 1950 era predominantemente rural, em poucas décadas, tornou-se predominantemente urbana, fazendo com que a cidade se urbanizasse sem a devida contrapartida da organização do espaço urbano, cujo resultado foi a formação de periferias e das favelas sem nenhuma infraestrutura.

A falência do "Walfare State" revela-se em conseqüências drásticas às populações situadas na linha da pobreza ou miséria, onde estão expostas todas as mazelas da sociedade. Portanto, as diversas faces desse estilhaçado espelho da pobreza, podem revelar, através de qualquer estilhaço, a totalidade na qual ela se encerra.

A questão implícita às afirmações acima colocadas, não diz respeito somente ao papel do Estado perante a sociedade, mas há espectros sociais mais amplos, como a relação aos limites da cidadania em relação aos estreitos cenários onde se operam as realizações direcionadas para o "walfare" da população. Este é, sem dúvida, o principal teorema a ser demostrado a partir das suas três faces mais conhecidas: a pobreza, políticas públicas e a qualidade de vida.

"A intersecção entre pobreza, políticas públicas e qualidade de vida revelam um espaço, especificamente público, cuja materialização tem revelado, tanto para a explicação dos contornos da linha da...

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